Alessandro Valentim – Lições de terreiro: quando temos a certeza do amor?

Maria Mulambo canta ‘’um amor faz sofrer’’, enquanto Marília Mendonça nos ensinou que ‘’ninguém vai sofrer sozinho’’. As palavras das Pombagiras são como as canções sertanejas. Elas nos acolhem, nós nos identificamos e aprendemos a superar os desamores. No terreiro, o choro é apartado pelos seus irmãos. Já na vida, as mágoas podem ser compartilhadas com os amigos em um karaokê na Feira de São Cristóvão, por exemplo.
E é mesmo verdade que o ‘’sinônimo de amar é sofrer’’, bem como ‘’Maria bebe todas para curar a minha dor’’. O erro mais comum dos apaixonados é quando escolhem ter a certeza do amor que sentem depois que não dá mais tempo de viverem as suas histórias. Não precisa ser assim. As Marias nos ensinam que podemos desatar os nós.
Uma vez, Padilha ensinou a este jornalista que o amor se prova depois de uma tempestade. Muito sábia, a guardiã da minha mãe carnal me explicou que temos a certeza do amor quando conhecemos as tempestades um dos outros e mesmo assim não sentimos vontade de ir embora.
Temos compreensão por quem amamos. Os defeitos dos outros, os seus problemas familiares e os seus traumas não são motivos que nos pedem paciência. A paciência acaba. Quando você se depara com essas realidades e entende que as pessoas são humanas, decide ficar e trabalhar em equipe para aprimorar os limites do seu par e os seus, afinal todo mundo tem defeito, você está sendo compreensivo e amando de verdade. Quem ama não pensa em desistir, apenas usa seu tempo com diálogo para evitar desgastes da convivência – afirmou Mãe Carla da Oxum, explicando o ensinamento de Padilha.
Entre uma canção e outra ou entre uma consulta ao tarot e outra, aprendemos a dar valor aos presentes que o destino nos dá. Uma música viralizou recentemente e une esses dois elementos ‘’caso do acaso bem marcado em cartas de tarot’’. Não se apaga o que tá escrito nas estrelas porque o céu está repleto de nuvens, afinal, ele voltará a brilhar certamente. Quantas histórias lindas já deixaram de viver por desistirem rápido demais? Se desistiu, não era amor.
Antes das palavras de Padilha, eu já havia desistido de pessoas. De algumas, rápido. De outras, após muita insistência. Comum entre todos esses casos foi a vontade desistir, presente desde antes de tomar a decisão. Curiosamente, após essa conversa, a vida me presenteou com um amor diferente. E foi aí que aprendi a lição.
Mais uma vez me apaixonei. Acreditei que essa habilidade havia partido com as dores do passado, mas não. No primeiro beijo, meu corpo reagiu com borboletas no estômago. Éramos dois desconhecidos, que não sabiam nem sequer seus nomes. Nos enxergamos no escuro. A ocasião que não renderia uma conversa vazia foi o início de uma série de conquistas. Convites insistentes, cinema, flores. Não era um desafio. Era a motivação de algo maior, como uma certeza de um futuro.
O destino me presenteou com alguém que trouxe sentido para se apaixonar durante ‘’a estação que não tem cor’’. Os medos tornaram- se segurança, enquanto a ansiedade se moldou a uma felicidade genuína a cada encontro marcado. Os abraços noturnos, as piadas contra o mundo, o frescor de declarar paixão na Praia da Bica. O inesquecível eternizado numa paixão que simplesmente aconteceu. E tá tudo bem.
Expliquei como tive a certeza da paixão, a partir das experiências e sentimentos despertados, então vou contar como tive a certeza do amor. Nossas divindades, cada um dentro do seu culto, nos puseram diante de uma prova. Nossas imaturidades foram expostas diante de todos em um momento que era para ser apenas mágico. A gente se machucou, mas a gente se descobriu. Juntos, aprendemos lições e limites um do outro e as palavras de Padilha ecoaram nos meus ouvidos.
Toda tempestade que ele me apresentou foi a razão de ter sido deixado para trás por quem desistiu. Toda tempestade que eu apresentei foi motivo da solidão que me abraçou por um tempo. E no dia após o caos, enquanto todos davam como certa a volta dos barcos para terra firme, nós nos surpreendemos. Nem eu, nem ele. Nenhum de nós pensou em desistir. Não tivemos paciência, tivemos compreensão. Não soltamos, seguramos a mão. Não cedemos, enfrentamos tudo e todos porque sempre foi e é amor.
Depois de tudo ‘’por que ainda me olha assim?’’. Com tanta gente interessante, alguém só é tão importante quando se tem amor de verdade. Esta foi mais uma lição que aprendi, impulsionada pelos ensinamentos do terreiro. E você, também aprendeu a entender o amor com as palavras de Maria?

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