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XP vê seca de IPOs, mas aposta em dívida e venda de clubes de futebol em 2023

Na semana passada, no último jogo do Brasil na Copa do Mundo do Qatar, Pedro Mesquita, head do banco de investimento da XP Inc., teve a oportunidade de conversar com o presidente da Fifa, Gianni Infantino, a respeito das mudanças pelas quais o futebol brasileiro tem passado. 

Apesar da derrota da seleção brasileira, Mesquita pode mostrar as primeiras vitórias que o futebol brasileiro teve no processo de profissionalização. A maior delas foi a aprovação pelo Congresso, em 2021, da figura da SAF (Sociedade Anônima do Futebol), que transforma os clubes em empresas e permite a chegada de investidores. 

A XP tem sido uma das principais responsáveis por avançar a agenda da profissionalização do esporte no País. O maior feito foi dar o pontapé inicial às SAF, ao assessorar a venda  de parcelas da divisão de futebol de Cruzeiro e Botafogo, no ano passado. E segundo Mesquita, diante do sucesso das duas operações, vem mais por aí.

“Já temos pelo menos mais cinco clubes de grande expressão que devem se privatizar e a gente acha que as operações vão acontecer ao longo de 2023”, diz ele ao NeoFeed. “Esse é um negócio em que investimos bastante e estamos bastante animados.”

No comando do banco de investimento da XP desde 2014, o tema da profissionalização é o que mais empolga Mesquita, contrastando com a expectativa dele para o mercado de capitais. 

Para quem esperava a retomada de ofertas públicas iniciais de ações (IPO, na sigla em inglês) em 2023, Mesquita diz que os primeiros sinais emitidos pelo governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva apontam que o próximo ano novamente será marcado pela seca de aberturas de capital. 

Segundo ele, a falta de previsibilidade e controle do lado fiscal prejudica a retomada das operações, apesar da existência de empresas que têm interesse em acessar o mercado. 

“Tudo depende do governo”, afirma Mesquita. “A expectativa é que a gente tenha um mercado fraco para IPOs e follow ons [em 2023] até que o novo governo consiga dar a previsibilidade necessária para um corte de juros.”

Os juros em alta já foram um grande inibidor de operações neste ano. Depois de um 2021 histórico, com 46 IPOs e 26 follow ons, este ano deve fechar com 17 ofertas, todas subsequentes. Deste total, a XP participou de seis, entre elas a oferta da Arezzo e da Equatorial. 

Com o cenário levando as empresas a ficarem em compasso de espera, aguardando sinais de melhora para retomarem planos de IPOs, Mesquita diz que, além do futebol, quem deve bater um bolão em 2023 dentro do banco de investimento será a área de emissão de dívida e a parte de fusões e aquisições (M&As).

Acompanhe os principais trechos da entrevista ao NeoFeed:

Como você avalia 2022 em termos de quantidade de IPOs e follow ons? Está dentro do esperado?Sim. E a primeira coisa que queria dizer é que o mercado não tem partido, ele segue totalmente a curva de juros, que representa as expectativas futuras da economia. Como o ano de 2022 foi um ano de alta de juros, pressão inflacionária no mundo, a quantidade de operações ficou dentro do esperado, porque com juros mais altos ocorrem operações pontuais. Foi o que aconteceu com Iguatemi, Equatorial, que fez uma aquisição, e a privatização da Eletrobras. Não é que teve pouca operação porque o mercado não gostava do governo Bolsonaro ou gosta de outro governo. Não tem governo. O que tem são as expectativas de juros, construídas em cima de um arcabouço que contempla previsibilidade fiscal e a política macroeconômica. 

O que esperar para 2023? Como a transição de governo tem afetado as perspectivas de operações?O mercado vê uma previsibilidade muito baixa na política fiscal. Por isso, a curva de juros futura está alta. Os economistas, que previam até antes das eleições cortes na Selic em 2023, já não estão prevendo mais, com algumas casas inclusive prevendo alta. E como o novo governo não é a favor de privatizações, hoje, a expectativa é que a gente tenha um mercado fraco para IPOs e follow ons, até que o novo governo consiga dar a previsibilidade necessária para um corte de juros.

Diante deste cenário, você então não espera IPOs e follow ons?A gente teve uma deterioração do mercado desde as eleições, com as sinalizações que vieram do novo governo. Então, hoje, o mercado espera zero IPOs e, no limite, alguns follow ons muito mais estratégicos, para financiar alguma aquisição, levantar capital para comprar concorrente, algo do tipo.

“O mercado não tem partido, ele segue a curva de juros, que representa as expectativas futuras da economia”

Este cenário representa uma mudança muito forte do que vocês esperavam antes das eleições? Porque existia uma expectativa de que a Selic começasse a cair em 2023.Antes das eleições, e independente do candidato, todas as casas, como mostra o Relatório Focus, previam corte de juros. A maioria das casas em meados do ano que vem. E, como o mercado trabalha com expectativas, a gente previa um mercado muito bom, mas ele se comprometeu muito. É um cenário que pode mudar, ele não está dado. O novo governo precisa rapidamente sinalizar uma política fiscal ortodoxa, para que o mercado possa enxergar a possibilidade de queda de juros e assim a economia voltar. 

Vocês estavam estruturando operações, esperando um cenário positivo em 2023? Tinham companhias interessadas em fazer IPOs?Sim. A gente tinha uma lista de companhias interessadas, várias em negociação, inclusive. Mas hoje todas as conversas estão paradas. 

Algum setor tinha mais empresas de olho em realizar IPOs ou follow ons?Tinha um pouco de tudo. Tinha setor de saneamento, que estava super quente, mas que agora deve desaquecer. O Brasil é um país muito grande, tem muito expoente setorial no Brasil e a gente tem um número de empresas com capital aberto muito pequeno, perto do tamanho da economia. Tem uma demanda reprimida muito grande para IPOs. 

Uma retomada consistente das operações está nas mãos do governo?Tudo depende do governo. O BC é independente e ele só vai diminuir a taxa de juros com previsibilidade e ortodoxia fiscal. Até o momento, o novo governo não sinalizou isso. Ele vem sinalizando o contrário. A própria indicação dos integrantes para a economia, o presidente do BNDES, não mostra, pelo menos por ora, a sinalização que o mercado queria. Isso não quer dizer que não possam fazer um bom trabalho. De novo, não é que o mercado gosta ou não gosta da pessoa que entrou, o mercado é apolítico. Ele vai olhar a queda dos juros. E isso só vai acontecer com um cenário fiscal controlado. 

E no caso de M&As?M&A sempre acontece, com o mercado melhor ou pior. É claro que com um mercado atrativo é melhor. Não é como IPO, que a janela fecha. Mas entra numa fase mais difícil, com o cenário que a gente vê, porque as empresas têm menos apetite para tomar riscos, comprar um concorrente, colocar propostas. Os fundos também. Um mercado menos atrativo também inibe algumas operações, mas os M&As acontecem, porque tem oportunidades, as empresas precisam de caixa e os fundos conseguem comprar a preços atrativos. É um mercado que a gente enxerga, pelo menos aqui na XP, que a gente vai crescer bastante. 

Em quais áreas você imagina que o banco de investimentos tem bons potenciais de crescimento em 2023?O mercado de dívida continua acontecendo, ele vem crescendo. Cresceu no ano passado e vai crescer no próximo ano. M&A vai acontecer e a parte de operações de capitais estará em compasso de espera. Onde vemos o grande diferencial é no mercado de dívida. Neste ano, grande parte da receita está vindo de emissão de dívida e no ano que vem, dentro das nossas análises, também será. 

Vocês foram pioneiros no mercado de SAF. Ainda há interesse dos clubes? Estão com conversas com clubes?Já temos pelo menos mais cinco clubes de grande expressão que devem se privatizar e a gente acha que as operações vão acontecer ao longo de 2023. A gente prevê um mercado quente, é o futuro do futebol, da profissionalização da área, e tem todas as discussões a respeito da liga [de clubes]. Esse é um negócio em que investimos bastante e onde estamos bastante animados para 2023. 

“O interesse dos fundos internacionais pelos clubes do Brasil tem aumentado”

O cenário econômico não afeta em nada?Talvez em um cenário econômico melhor, os clubes poderiam obter valores maiores. Mas não é o cenário econômico que vai deixar de fazer as operações acontecerem. 

Como as experiências com Cruzeiro e Botafogo ajudaram a vender a ideia das SAFs aos clubes?As experiências foram ótimas. O Cruzeiro e o Botafogo estão em outro patamar e cada vez mais os clubes veem que essa é a única saída para conseguir competir. O futebol é um mercado mundial, o jogador é precificado em dólar e euro. E os clubes perdem em receita em relação aos Estados Unidos, por exemplo. Isso faz com que a gente perca jogadores para a liga americana e, cada vez mais, para as ligas europeias. O único jeito do Brasil competir com as outras ligas, e nem estou falando das maiores, como a inglesa ou da Espanha, é profissionalizando. A SAF e o desenvolvimento de uma liga de clubes são as duas grandes alavancas do futebol brasileiro. 

Vemos uma série de grupos internacionais, investidores, que apostam no futebol pelo mundo. Existe interesse pelo futebol brasileiro? Eles pensam em investir nos clubes ou ter acesso a jogadores?Existe o capital de growth, que quer comprar um time para crescer o valor do time. E aqueles que querem comprar um time para aproveitar a fábrica de talentos que temos no futebol nacional. Posso dizer que o interesse dos fundos internacionais, e dos investidores que não são só fundos, pelos clubes do Brasil tem aumentado. A lei da SAF é muito nova, de 2021. Estamos em via de fechar um grande clube agora e estamos com vários outros mandatos e conversas acontecendo.

Acredita que ainda veremos um IPO de um clube de futebol brasileiro?Eu acho que, para clubes, não é uma boa opção, diante do que se viu pelo mundo. Existem vários clubes com capital aberto, em grandes bolsas do mundo, como o Manchester United e o Borussia Dortmund. E a precificação e o entendimento não é bem visto pelos investidores. A performance não é muito boa. Eu acredito que futebol não seja um setor para mercados públicos.

Fonte: Neofeed
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Patricia Oliveira

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